Há necessidade de conscientizar acerca das práticas e representações que configuram o racismo, apresentando aos alunos a verdadeira história e tradição do povo negro no Brasil, de maneira íntegra, sem estereótipos que distorcem e não retratam fielmente a trajetória dos descendentes de africanos, sem mensagens subliminares que consolidam uma sociedade racista e excludente.
Assim sendo, ao elaborar um projeto sobre Cultura Negra deve-se pensar em atividades que possibilitem aproximar nossos alunos da riqueza cultural afro-brasileira, aprofundando o estudo das fortes raízes culturais africanas, visando elevar a autoestima da criança negra e sua percepção e atuação sobre si mesma e seu lugar no mundo.
Desde a mais tenra idade deve-se trabalhar o assunto, privilegiando a questão da identidade, do respeito à diversidade e da autoaceitação. Toda a comunidade escolar deve estar inserida no projeto e não apenas os afro-descendentes, de forma em que fique claro que conhecer as variadas culturas é essencial, despertando na criança o respeito pelas outras pessoas independentemente da raça. Para tal, é fundamental divulgar o lado positivo da história negra, não apenas as questões de escravidão, miséria e sofrimento, proporcionando situações didáticas centradas em dinâmicas, vivências, ações e reflexões, no estímulo a criticidade e na resolução de problemas que possibilitem aos alunos a pensarem na questão de forma ética.
A Pedagogia de Projetos visa transformar o espaço escolar em um espaço vivo de interações, aberto ao real e às suas múltiplas dimensões. O status de igualdade será conseguido quando o professor estiver atento para contemplar alunos negros e brancos, democraticamente, nas pequenas atividades do dia a dia, através do que chamamos instrumentos ou ferramentas pedagógicas. Contar histórias em que apareçam crianças negras como protagonistas vivendo situações cotidianas, buscar epopéias de povos africanos com seus heróis e suas sagas, procurar imagens de famílias negras, profissionais negros, políticos, escritores, cientistas negros para estar lado a lado dos brancos já colocados nos murais e estudos escolares – eis alguns procedimentos que podem ser adotados.
Sugestões de Atividades
Para iniciar o tema proponha aos alunos que listem duas características físicas e duas características de seu caráter/personalidade. Recolha todas as listagens e, de forma lúdica, leia uma a uma para a classe instigando os alunos a descobrirem quem é o dono de cada característica. Após a brincadeira abra uma roda de conversa levando-os a refletirem sobre a dinâmica, sondando: O que percebemos com essa vivência? Existem pessoas exatamente iguais? Permita que os alunos expressem suas opiniões e, em um segundo momento, proponha que todos se observem atentamente e analisem as diferenças entre eles, levando em consideração os tipos de cabelo, as cores dos olhos e da pele, os formatos dos narizes e dos lábios, as alturas, etc. Para criar um clima mais afetivo introduza uma música ambiente tranqüila e permita o toque caso desejem.
Como dever de casa peça que levem figuras de pessoas diferentes e de pessoas que admiram/idolatram.
É importante o professor também pesquisar e contribuir levando imagens de crianças do mundo inteiro, das diversas religiões, como se vestem e como são diferentes.
Peça aos alunos que separem as figuras dos ídolos e primeiro explore bastante as diversas imagens. Peça que justifiquem a escolha das mesmas, que dêem um adjetivo para cada uma delas: essa pessoa parece ser...? Proponha que agrupem as figuras usando o critério que preferirem e que o justifiquem. Converse, então, sobre o preconceito e a discriminação, baseados na aparência.
Aproveite para falar sobre os tons de pele, sobre a importância de diversas culturas, riqueza cultural dos diversos continentes.
Com as figuras dos ídolos analise quantos são negros e liste nomes de personalidades negras conhecidas da classe. Promova uma conversa informal com a classe para perceber que critérios eles utilizam para eleger seus "modelos": beleza, riqueza, talento, carisma, etc.
Em artes plásticas podem ser confeccionados bonecos negros. É interessante “dar vida” aos bonecos propondo que os alunos os transformem em personagens que podem interagir através de dramatizações e entrevistas.
Brincando, a criança aprende a lidar com o mundo e forma sua personalidade, recria situações do cotidiano e experimenta sentimentos básicos. Logo, vale pesquisar, juntamente com os alunos, jogos e brincadeiras tradicionais africanos e possibilitar momentos de integração e descontração onde as crianças brinquem e joguem.
Sugestão de Jogo
Yoté, da África Ocidental
Semelhante ao jogo de damas. Na África Ocidental, as crianças cavam buracos na areia, catam seixos ou pedacinhos de madeira, e estão prontas para jogar. O professor pode usar peças de diferentes tipos e confeccionar seu próprio tabuleiro.
Como se joga:
Os jogadores revezam-se, colocando uma peça de cada vez em qualquer espaço no tabuleiro. Não é preciso colocar todas as peças antes de passar para o estágio seguinte. Um jogador pode guardar algumas peças para serem colocadas mais tarde.
Os jogadores revezam-se movimentando uma peça de cada vez em linha reta até o próximo espaço, se estiver livre. Os movimentos são feitos nos sentidos “para frente” e para trás” ou “para direita” e “para a esquerda”, nunca no sentido diagonal.
Um jogador pode saltar por cima da peça do adversário até o próximo espaço, se este estiver livre, e remover a peça do tabuleiro. Além disso, o jogador pode capturar do tabuleiro outra peça do adversário como prêmio.
O jogador que capturar todas as peças do adversário será o vencedor. Se cada jogador tiver três ou menos peças no tabuleiro, o jogo acabará em empate.
Literatura infantil
Na Literatura existem grandes títulos que rendem excelentes trabalhos acerca do tema. Tendo em vista que estimular e desenvolver o hábito e o prazer pela leitura deve ser objetivo sine qua non seja qual fôr o tema do projeto. Entre eles sugerimos:
LIMA, Heloísa Pires. Histórias da Preta. São Paulo: Cia. das Letrinhas, 1998/2000.
LIMA, Heloísa. A Semente que veio da África, editora Salamandra.
MACHADO, Ana Maria. Menina Bonita do Laço de Fita. São Paulo: Melhoramentos.
OLIVEIRA, Alaíde Lisboa de. A bonequinha preta. Belo Horizonte: LÊ, 1982.
OTERO, Regina; RENNÓ, Regina. Ninguém é igual a ninguém: o lúdico no conhecimento do ser. São Paulo: Editora do Brasil, 1994.
PEREIRA, Edimilson de Almeida. Os reizinhos do Congo. São Paulo: Paulinas, 2004.
RAMOS, Rossana. Na minha escola, todo mundo é igual. São Paulo: Cortez, 2004.
ROSA, Sônia. O menino Nito. Rio de Janeiro: Pallas, 2002.
SANTOS, Joel Rufino. Dudu Calunga. São Paulo: Ática, 1996.
SANTOS, Joel Rufino. Gosto de África. Histórias de lá e daqui. São Paulo: Global, 2001.
UNICEF. Crianças como você: uma emocionante celebração da infância. São Paulo: Ática, 2004.
ZIRALDO. O Menino Marrom. São Paulo: Melhoramentos, 1986.
COSTA, Madu. Meninas negras. Editora Mazza.
COSTA, Madu. Koumba e o tambor diambê. Editora Mazza.
RODRIGUES, Martha. Que cor é a minha cor? Editora Mazza.
BARBOSA, Rogério Andrade. Contos africanos - para crianças brasileiras. Ed. Paulinas.
ROCHA, Ruth. O Amigo do Rei, Editora Ática.
BRAZ, Julio Emílio. Felicidade não tem cor.
DIOUF, Sylviane. As tranças de Bintou.
Envolver parentes dos alunos e pessoas negras da comunidade pedindo que contem histórias de suas vidas, em seguida, propor que os alunos transformem os relatos reais em textos diversos, que podem ser ilustrados com fotos e desenhos. Valorizar o trabalho dos alunos com uma tarde de autógrafos.
A presença negra nas artes
O estudo da presença negra e mestiça na arte brasileira pode partir de nomes como Mestre Valentim e Antonio Francisco Lisboa, o Aleijadinho, homens de um tempo em que a formação artística se dava de maneira coletiva e não excludente nas corporações de ofício.
A trajetória de artistas negros e mestiços que cursaram a Academia Imperial de Belas Artes no início do século XX é um caminho para se avaliar o impacto da Missão Francesa no Brasil. Nomes como Estevão Silva, Antonio Firmino Monteiro, Antonio Rafael Pinto Bandeira, João Timóteo da Costa, Artur Timóteo da Costa precisam ser conhecidos e sua trajetória de vida, bem como suas obras, devem ser apreciadas pelos estudantes brasileiros.
Artistas negros do século XX como Benedito José Tobias, Iêda Maria, Rubem Valentim, Mestre Didi, Ronaldo Rêgo, Otávio Araújo, Jorge dos Anjos, Emanoel Araújo, entre outros, recompoem os fragmentos de uma presença negra na História da Arte Brasileira.
Há forte presença da arte negra na vida social brasileira, conhecida como arte popular. Apesar da controvérsia, que atribui à expressão artística mais popular um status de arte menor, ela retrata um outro Brasil e está presente em todo o território nacional, e tem como artistas, brasileiros negros e mestiços que devem ser valorizados e conhecidos pelos currículos escolares, como Heitor dos Prazeres, João Alves, Agnaldo Manoel dos Santos, Artur Pereira, Sérgio Vidal, entre outros.
Analisando as obras de Jean Baptiste Debret (1768-1848) é possível conhecer como era o cotidiano das crianças na época da escravidão. As obras de Debret, que foram comparadas às fotografias publicadas em jornais atuais, dão um panorama crítico da situação do passado e do presente.
Além das análises e releituras das obras de arte, sugerimos produzir com argila ou papel marche estátuas de personagens negros para uma exposição.
Músicas
Desde o lundu e as orquestras compostas de escravos músicos até os dias atuais, é reconhecida a marca negra africana na música e na musicalidade brasileira. A música, acompanhada da gestualidade, foi marca de resistência e da presença dos ancestrais das culturas dos povos africanos que para aqui vieram. A memória contida no corpo e cantada pela voz permitiu a manutenção de vidas marcadas pela experiência da escravidão e, no avesso do sofrimento, trouxe alegria, criatividade e novos arranjos para a expressão musical e corporal brasileiras.
As festas tradicionais brasileiras, como Maracatus, Bumba-meu-Boi, Cavalhadas, Marujadas, Folia de Reis, Festas do Divino, Congadas, constituem importantes elementos da cultura popular, carregados de valores e sentidos próprios, tendo um grande significado pelo conteúdo que representam e expressam
O sorriso, o humor, o disfarce, a peleja, altivez, a alegria, a crença, a tradição, a celebração, a vitória, a reciprocidade, estão inscritos no corpo de cada um dos participantes, para dar sentido e contar sem palavras o que está representando.
Tomar contato com essas e outras manifestações da cultura popular, trazer para a escola grupos tradicionais que possam apresentar o vigor da sua experiência e assim, alargar a reflexão sobre o conteúdo e o significado histórico de cada uma destas representações aproxima o aluno de uma outra versão, fundamental, da história brasileira. Recriar junto aos alunos essas celebrações culturais, compreendendo os seus conteúdos é sem dúvida um instigante projeto pedagógico, que só terá sentido se organizado e experimentado coletivamente, conforme a própria natureza das expressões culturais populares.
Sabemos que músicas estimulam e rendem boas atividades de interpretação, debate e reflexão. De acordo com RCNEI “A linguagem musical é excelente meio para o desenvolvimento da expressão, do equilíbrio, da auto-estima e autoconhecimento, além de poderoso meio de integração social.” Dentre as músicas aquelas que mais costumam agradar os alunos são: Mundo Negro (O Rappa); Pérola Negra (Daniela Mercury); Mamma África (Chico César); Meu ébano (Alcione); A Loirinha, O Playboy E O Negão (Kelly Key); Olhos Coloridos (Sandra de Sá).
Com as músicas é possível realizar:
Pesquisas de músicas tipicamente africanas;
Pesquisas de outras canções que abordam o tema;
Criação de raps, paródias, jingles;
Integração com a Língua Inglesa através de pesquisa e audição de canções famosas de cantores negros;
Exercícios de aquecimento e articulações do corpo voltados para a dança negra;
Exercícios de respiração e ritmo;
Movimentos básicos da dança afro (orixás, cotidiano, etc.);
Criação, elaboração e montagem de coreografias;
Criação e confecção de figurinos, adereços e instrumentos de percussão;
Apresentar danças africanas, jogos como capoeira, e músicas, como samba e maracatu.
É interessante, também, enaltecer e valorizar os cantores negros que se destacam no cenário artístico-cultural do país. Propor um estudo sobre a vida de cada um deles, selecionar informações relevantes produzindo biografias em grupos ou duplas, reconhecendo as características desse tipo de texto. As biografias podem ser ilustradas com caricaturas produzidas nas aulas de Artes Plásticas. Em um segundo momento, os alunos podem escrever suas autobiografias.
Ouvir e fazer tentativas de tirar som e ritmo de instrumentos típicos: caixa de fósforo, pandeiro, agogô, chocalho, atabaque, berimbau, etc. Além de tocar os instrumentos, saber de que são feitos, como são feitos e, aprender a construir algum deles.
Outras idéias...
Leitura e análise de alguns artigos da Declaração Universal dos Direitos Humanos, fazendo uma comparação entre o antes e o depois do tráfico negreiro e a escravidão no Brasil. É fundamental fazer a comparação com o modo de vida do negro no nosso país, na época da escravidão, nos quilombos e nos dias de hoje: O que mudou? O que ainda é necessário mudar? Como mudar?
Exibição de vídeos (filmes e documentários). A internet também pode auxiliar na aprendizagem através do fácil acesso as mais variadas fontes de pesquisas onde o educando, com a orientação do professor, pode pesquisar e ter acesso a imagens e materiais ricos sobre o tema em pauta.
Conhecer a culinária e chás trazidos da cultura afro-brasileira, abrindo espaço para degustação através de lanche coletivo. Pode-se aproveitar para explorar as receitas como gênero textual e propor produções onde os alunos imaginarão que ingredientes misturarão para fazer porções mágicas para acabar com o racismo, a discriminação e o preconceito.
Construção de um álbum/glossário com palavras de origem africana, curiosidades sobre o povo africano, atualidades, etc.
Espera-se com presente artigo contribuir para a construção do senso de uma sociedade mais justa e igualitária, em que pessoas de etnias diferentes não sejam discriminadas. Assim, no futuro, não será necessário fazer campanhas e criar datas para conscientizar a população de que não há raça superior à outra, existe apenas a raça humana. Além dos alunos apropriarem-se de diversos saberes e conscientizarem-se sobre temas relevantes como legislação, tolerância, direitos e deveres.
É papel do professor:
Escutar o que os alunos sabem e necessitam expressar;
Não se colocar como o único e principal informante;
Conectar o tema a outros conteúdos e à realidade;
Organizar os espaços e tempos de acordo com as exigências do trabalho a ser executado;
Adaptar as diversas sugestões de atividades aos interesses, necessidades e faixa-etária de seus alunos.